Porto Saúde lança cobertura ‘microrregional’ no Rio, e CEO critica regulação do setor: ‘Planos não comportam remédio de R$ 10 milhões’

Modelo tem quatro hospitais e laboratórios. Executivo argumenta que cobertura enxuta garante mais acesso de pequenas e médias empresas, já que contrato é 45% mais barato que os tradicionais

 

Um plano de saúde “microrregional” — que cobre apenas quatro hospitais e laboratórios em bairros específicos, escolhidos pelo usuário — é a nova aposta da Porto Saúde. Depois de lançar o modelo em São Paulo, onde já acumula 15 mil usuários, a operadora do grupo Porto começa a vendê-lo no Rio a partir de terça-feira.

O foco do produto, segundo o CEO, Sami Foguel, são as pequenas e médias empresas (PMEs), com até 99 funcionários.

Apesar de concentrar a maior parte dos empregos formais brasileiros, esses negócios historicamente têm dificuldades em oferecer o benefício às equipes. Por isso, o contrato de cobertura enxuta custa 45% menos que os tradicionais planos empresariais, ele calcula.

A rede credenciada inclui hospitais como o Icaraí, o Nossa Senhora do Carmo e os da Rede Casa, localizados nos bairros de Bangu, Barra da Tijuca, Campo Grande, Centro, Humaitá, Ilha do Governador, Santa Cruz e Tijuca, na capital fluminense, além de São Gonçalo, Niterói, Petrópolis e Teresópolis.

Em entrevista ao GLOBO, o executivo diz acreditar que o produto pode ocupar o espaço no mercado fluminense deixado pela Golden Cross, liquidada pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), e atrair usuários que têm desembarcado da Unimed-Ferj, em crise. Foguel também afasta a possibilidade de que a Porto comercialize contratos individuais “enquanto reajuste for regulado”.

Como funciona o plano da linha Porto Bairros?

A ideia é um plano microrregional, em que cada titular, numa lista de 12 bairros, escolhe quatro, e em cada um deles tem um hospital e um laboratório conveniados para atendimento. Afinal, quantos hospitais você usa na sua vida? Tipicamente, as pessoas têm hospitais de referência, perto de casa ou do trabalho. Por isso, criamos esse produto, que é inovador. É uma customização individual, onde cada funcionário, com as suas necessidades e de seus dependentes, escolhe o que funciona melhor para si.

Esse modelo pode levantar dúvidas sobre restrição de acesso. E se o paciente precisa fazer um exame ou procedimento coberto pelo rol mas não prestado pelo hospital ou laboratório credenciado?

Nesse caso, temos os outros hospitais associados. O plano, obviamente, cobre todo o rol. Mas algumas especialidades são um pouco mais escassas, como maternidade, mas temos parceiros de apoio para esses casos. Basta que o usuário procure a operadora pelo aplicativo.

E como funcionam as consultas?

Os beneficiários têm acesso a todo o time médico da Porto no Rio. Temos hoje médicos próprios e também rede credenciada.

PMEs tradicionalmente têm dificuldade de oferecer benefícios às equipes, principalmente planos de saúde, por causa do alto custo. Essa é uma forma de garantir acesso para essas empresas?

Sem dúvida. Se pensarmos nos nossos planos tradicionais, os da Porto Bairros chegam a ser 40% mais econômicos, e baratear amplia o acesso. Diferentemente dos produtos tradicionais, em que boa parte dos clientes vem de outra operadora, no Porto Bairros há um aspecto de inclusão securitária. Cerca de 45% das nossas empresas clientes em São Paulo, nesse produto, não tinham plano antes. São restaurantes, escritórios de contabilidade, açougues, pequenos empreendimentos.

Há planos de replicar esse modelo para outras regiões?

Depende da região. São Paulo e Rio funcionam bem por serem grandes cidades e por terem uma considerável dispersão geográfica. O que não quer dizer que esse conceito de modularidade não possa se aplicar em outros lugares.

O novo plano da Porto se soma a um movimento de operadoras apostando em redes menores, acordos exclusivos, combos com serviços digitais. Há uma reconfiguração do setor?

Totalmente. Nos últimos anos vimos a SulAmérica, que era uma operadora independente, ser vendida para a Rede D’Or; a Allianz deixou de operar no país; Amil e Dasa criaram (em sociedade) a rede Ímpar; e Bradesco e Rede D’Or criaram a Atlântica D’Or. Há muita consolidação e mudanças. É um mercado desafiador.

Acredita que esse produto pode ocupar um espaço no mercado carioca deixado pela Golden Cross e também atrair usuários que desembarcaram da Unimed-Ferj?

Sem dúvida. Quando lançamos um produto, não temos esse target de competição, mas acredito que vai ser apelativo para parte da população que estava nessas duas operadoras. Não que eles estejam desassistidos, mas ficaria muito feliz de atraí-los, assim como empreendedores e empreendedoras que não dão esse benefício para seus funcionários.

Consumidores, especialistas e a própria Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) defendem a retomada, pelas operadoras, da venda de planos individuais. Isso está no radar da Porto?

Enquanto o reajuste for regido pela ANS, de jeito nenhum. Em 2014, tínhamos 51 milhões de pessoas com planos de saúde. Agora, são 53 milhões. O país cresceu; então, a penetração de saúde suplementar caiu. E esses 53 milhões usuários, 25% da população, consomem 65% de todos os recursos da saúde. Entendo que existe uma mentalidade muito elitista da saúde suplementar, que é ter esse plano muito amplo, com rol “intergaláctico”, onde tudo cabe, e que fica cada vez mais caro e restritivo, de fato.

Deveria haver um espaço para diálogo. Os caminhos adotados nos últimos dez anos, claramente, não foram um sucesso. Haveria formas inteligentes de fazer o individual voltar (ao mercado). Por exemplo: se houvesse um pool do individual, assim como existe um pool do PME, em que cada operadora fizesse o reajuste anual baseado no seu pool. E quanto seria esse reajuste? O que fosse necessário. Poderia ser uma alternativa; pode haver outras. Mas enquanto houver uma regulação do governo, a gente não tem apetite para individuais.

Quais as expectativas da Porto com a decisão do STF, que aumentou as regras para cobertura de procedimentos fora do rol da ANS?

Acho que trouxe um pouco mais de racionalidade para as discussões sobre o rol. Foi uma decisão positiva para o setor, já que traz critérios. Há discussões interessantes sobre regulação, do ponto de vista de medicamentos de alto custo, que não têm no país compartilhamento de risco (com a indústria farmacêutica). Obviamente, todo mundo quer trazer a melhor medicina, mas boa parte dos planos de saúde hoje não comportam um remédio de R$ 10 milhões.

Há alguns meses, havia informações de que a Porto negociava a entrada de um sócio minoritário para a Porto Saúde. Como isso ficou?

Estamos sempre abertos a provocações. Podem chegar fundos (de investimento) interessados em ter uma participação. Nosso racional é que, se esse parceiro trouxer algum tipo de aporte para o nosso crescimento futuro, pode acontecer. E nem é financeiro, porque hoje a Porto não precisa de um reforço financeiro. Mas pode ser do ponto de vista de temas médicos ou de tecnologia. De fato, tivemos conversas, mas não progrediram.

Fonte: O Globo