Executivo da Marsh avalia vulnerabilidades específicas da região, desafios de modelagem e as novas oportunidades em seguros ambientais, infraestrutura resiliente e soluções baseadas na natureza
A presença do setor de seguros na COP30 foi mais estratégica e estruturada do que em qualquer edição anterior, consolidando a atividade como peça central na agenda de adaptação climática. No painel “A Importância da Natureza e da Água”, realizado na Casa do Seguro no dia 19 de novembro, Rodrigo Suárez, diretor de Clima e Sustentabilidade da Marsh para América Latina e Caribe, destacou que a compreensão dos riscos regionais, aliada à capacidade de modelagem e às soluções de resiliência, será determinante para que governos e empresas consigam reduzir perdas e fortalecer cadeias produtivas.
Em entrevista exclusiva ao Sonho Seguro, o executivo afirmou que a América Latina vive uma combinação singular de extremos: excesso de chuvas e inundações no Brasil, escassez de água no México, incêndios no Chile, poluição do ar nas grandes metrópoles e pressão sobre ecossistemas amazônicos que sustentam serviços essenciais, como abastecimento de água e energia. Ele afirma que o setor já passou da fase de apenas indenizar danos e começa a atuar na estruturação de estratégias preventivas, combinando transferência de risco com adaptação, infraestrutura resiliente e soluções baseadas na natureza.
Leia os principais trechos da entrevista:
Quais são os fatores regionais específicos que tornam o mercado de seguros da América Latina e do Caribe particularmente vulnerável aos riscos climáticos?De acordo com o relatório global de riscos mais recente da Marsh, os riscos de sustentabilidade estão ganhando peso em todo o mundo – eventos climáticos extremos, escassez de recursos, sistemas no limite, perda de biodiversidade e poluição estão entre os principais. Na América Latina, há nuances importantes: no Brasil, predominam eventos extremos ligados ao excesso de chuvas e inundações; no México, a escassez de água é o eixo central; no Chile, o foco são os incêndios; e na Colômbia, a preocupação recai sobre a escassez de recursos hídricos. Nas grandes cidades, a poluição do ar figura como um dos principais riscos, enquanto nos países amazônicos o desmatamento acende um alerta devido à relação direta com serviços ecossistêmicos essenciais, como água e energia.
Como você vê a interseção entre seguro tradicional, adaptação e mitigação climática? Esse é um tema em que a Marsh tem investido muito, especialmente ao lado do BID, com quem lançamos o documento Resilience Now: Fechando a Lacuna de Adaptação na América Latina e no Caribe. O material dialoga diretamente com os resultados esperados da COP30 em temas como recursos hídricos, infraestrutura, segurança alimentar e saúde. Há seguros que respondem bem a eventos como inundações, mas que precisam evoluir em relação a riscos emergentes, como ondas de calor e seu impacto em infraestruturas. Também entregamos um documento específico para infraestrutura no âmbito da COP. Construir resiliência e demonstrar capacidade técnica traz benefícios concretos para continuidade de negócios e redução de lucros cessantes, especialmente quando analisamos a cadeia de suprimentos e o uso crítico de recursos hídricos.
Quais são os desafios para que o setor de seguros atue de forma mais preventiva diante dos eventos climáticos? O principal desafio é compreender profundamente os riscos. Precisamos modelar adequadamente como eventos futuros podem se comportar a partir de padrões históricos, ter uma visão completa do cliente e avaliar não apenas ativos físicos, mas pessoas, operações e a eficácia dos planos de contingência. Mais do que isso, é importante olhar para os sistemas e entender como um evento pode repercutir em fornecedores, investidores, meio ambiente e clientes. Esse olhar sistêmico é o que aprimora nossa capacidade de atuar preventivamente e de mobilizar todos os atores envolvidos.
Como vocês avaliam a capacidade atual do setor de modelar riscos climáticos e como isso impactará prêmios, coberturas e o mercado de resseguros? É uma pergunta excelente, mas complexa. Modelar o impacto de uma inundação varia muito dependendo se estamos falando de uma cidade, uma plantação, uma pessoa ou uma indústria. Hoje temos ferramentas robustas para capturar essas diferenças, embora em algumas regiões ainda faltem dados consolidados. Em muitos casos, a situação muda de cidade para cidade ou de país para país. Modelos globais já permitem incorporar dados locais, o que melhora sensivelmente os resultados. A tecnologia avançou tanto que até celulares podem ser usados para registrar temperatura e alimentar modelagens de ondas de calor.
Existe alguma lacuna de dados ou metodologia na região que ainda precise ser superada? Sim. Variabilidade e fragmentação de dados ainda são desafios. Em um projeto recente para desenvolver soluções de seguros relacionados ao clima para 10 cidades latino-americanas, percebemos que algumas possuem excelentes informações sobre ondas de calor, outras sobre inundações, outras sobre populações vulneráveis. Um ponto particularmente relevante é a valorização da natureza: áreas com cobertura vegetal tendem a reduzir a temperatura ambiente e, com isso, diminuem a morbidade relacionada a ondas de calor.
Que oportunidades emergentes você identifica em seguros relacionados a soluções baseadas na natureza, infraestrutura resiliente e cadeias de suprimentos? Estamos avançando muito no chamado seguro ambiental, incluindo seguros para crédito de carbono, créditos de biodiversidade, coberturas ambientais e soluções paramétricas além do uso tradicional no setor agrícola. Há também espaço crescente para organizações com padrões de certificação de baixo impacto. Quando empresas combinam bom desempenho em sustentabilidade com gestão prioritária de riscos, suas cadeias de fornecimento se tornam mais robustas e resilientes.
Quais obstáculos regulatórios ou de mercado ainda precisam ser superados? Ainda existe uma visão muito baseada na vulnerabilidade e menos na resiliência. Nosso trabalho tem sido apoiar países, cidades, setores e organizações para que esforços de adaptação se traduzam efetivamente em maior resiliência. E resiliência precisa – e deve – ser recompensada.
Como você avalia o papel do setor de seguros nas discussões da COP30?A evolução é notável. Há poucos anos, o setor passava quase despercebido; hoje está no centro das discussões. A atuação da CNseg na COP30, com debates diários totalmente alinhados aos temas de ação – cidades, natureza, infraestrutura – foi fundamental. Soluções como créditos de carbono, créditos de biodiversidade e iniciativas para uma natureza positiva estão ganhando tração. Ver o setor de seguros participar da modelagem e das soluções para planos de adaptação setoriais, territoriais e nacionais é essencial para construirmos uma sociedade menos vulnerável, mais resiliente e melhor adaptada.
Fonte: Sonho Seguro








