Profissionais exercem importante papel de consultoria para os segurados e são o primeiro contato em caso de sinistro

A profissão de corretor de seguros está em expansão no Brasil desde a pandemia. Para se ter uma ideia, o número de profissionais cadastrados na Superintendência de Seguros Privados (Susep) como pessoa física cresceu 27% entre 2019 e 2023. Só em 2020, primeiro ano da pandemia de Covid-19, foram 9.336 novos registros de corretores, contra 6.122 em 2019 – um aumento de 52,4%.

O dado pode estar relacionado ao crescimento no número de apólices no período pandêmico, que parece ter acendido uma “luzinha” no brasileiro. No primeiro ano da Covid-19 no país, o seguro de vida cresceu em receita 9,2% (janeiro/2021 contra janeiro/2020). Em 2022, o crescimento foi de 17,8%, no mesmo mês. “A incerteza gerada pela pandemia, o medo de deixar dependentes desamparados, seja por problemas de saúde, seja pelo desemprego, podem, sim, ter tido o condão de aumentar a procura pelo seguro de vida”, analisa a diretora técnica da Susep, Jessica Bastos.

Ou seja, cresceu a demanda pelo produto e, assim, aumentou o leque de oportunidades para profissionais que comercializam o produto: os corretores de seguros. Eles são os principais agentes no mercado de seguros e têm uma atuação que vai muito além da venda. Em diversos momentos, é o corretor quem vai auxiliar o segurado em caso de sinistro – quando o segurado precisa dar entrada no seguro por algum motivo.

Dados da Susep mostram o número de corretores em atuação no Brasil desde 2019

Profissão: consultor

Daniel Salgado de Oliveira Neto, 39 anos, faz parte da leva de profissionais que iniciaram o ofício recentemente. Formado em Publicidade, ele é corretor de seguros desde meados de 2022 e entende que a profissão envolve um papel importante no mercado de seguros: o de prestar consultoria. Ele pontua que seguros em geral precisam ser personalizados para atender exatamente a demanda do cliente.

“Como funciona uma venda consultiva? É o que eu faço com o seguro de vida. Eu vou abordar vários temas com o meu cliente, quanto é o custo de vida dele e se ele tem dependentes, sejam filhos, cônjuge, pai ou mãe”, diz, lembrando que só depois de traçar esse diagnóstico é que ele vai oferecer o seguro adequado.

Daniel revela que já atendeu clientes que já tinham seguros, mas que não atendiam às necessidades específicas. “A gente pega essas apólices de banco e vê algumas coisas muito sem sentido. Por exemplo, existe uma cobertura que se chama capital de morte decrescente. Essa cobertura é um capital de morte alto que diminui com o passar do tempo. Isso acontece porque, às vezes, a pessoa tem um filho e à medida que esse filho vai crescendo, esse capital vai diminuindo. Quanto mais novo é o filho, maior o capital de morte na ausência dessa pessoa, porque entende-se que ele precisa mais”, explica. “Então, a gente faz esse cruzamento e pega clientes que nem filhos têm e contratam esse tipo de cobertura.”

Tem que se fazer presente

Daniel lembra que seguros de vida têm uma peculiaridade em relação a outros tipos de seguro, como os de bens (carros, imóveis etc): o cliente não precisa renová-lo anualmente. Quando um seguro tem essa exigência, de alguma forma, o cliente acaba lembrando do corretor que fez a apólice e entra em contato para renovar. Já no caso dos seguros de vida, cuja renovação é automática, o cliente pode passar anos sem entrar em contato com o corretor e até perder o telefone dele.

Foi o que aconteceu com a cunhada de Daniel. Segundo o corretor, ela passou mais de oito anos com um determinado tipo de seguro de vida, mas não tinha o contato do corretor. Quando começou a trabalhar no ramo, Daniel pegou a apólice dela para ver se tinha como melhorar a cobertura. Foi quando ele percebeu que o seguro contava com coberturas que ela mesma não conhecia.

“Ela ficou internada 11 dias e poderia ter recebido em torno de R$ 3.000 para cobrir as diárias de internação. Ela só sabia que ela tinha seguro de vida, mas não tinha noção de que tinha essa possibilidade dentro da apólice”, relata.

E é aí que entra a perspicácia da profissão: se fazer presente – a cunhada de Daniel estava “solta”. E Daniel faz isso de diversas formas. “Eu tenho uma planilha com aniversários que eu sempre mando mensagem. Mando também em data comemorativa, sempre tem alguma arte da minha corretora para enviar”, revela. “Clientes maiores, no primeiro ano, eu mando um presente”, exemplifica.

Segundo Jessica Bastos, esse papel de consultoria é o principal na profissão. “Os corretores são os profissionais responsáveis por aproximar o segurado do principal objetivo do seguro: ter tranquilidade e garantias patrimoniais bem montadas. Ele pode ajudar o segurado a identificar corretamente os riscos a que está sujeito e buscar as garantias adequadas para a proteção contra esses riscos”, analisa. 

O corretor é o primeiro contato em caso de sinistro

A profissão do corretor envolve não apenas a questão de orientar o cliente sobre as coberturas como também “resolver a vida” dele em caso de sinistro. Renato Campos, 44, é corretor há 11 anos e tem um cliente que, nos últimos dez anos, precisou de sua assessoria em pelo menos três ocasiões de sinistro.

Ele conta que o cliente, dono de um pet shop, sofreu um acidente, precisou dar entrada em um seguro que cobre afastamento temporário e se ausentou do trabalho por seis meses. Foi Renato quem resolveu os trâmites e o orientou sobre as burocracias para receber o dinheiro.

Depois, na pandemia, momento que pegou muita gente de surpresa, Renato foi acionado mais uma vez para auxiliá-lo a resgatar um dinheiro que havia aplicado na previdência privada. E, por fim, o carro desse cliente foi roubado, e Renato mais uma vez foi quem prestou a consultoria sobre documentação necessária para que ele recebesse de volta 100% do valor do veículo (pela tabela Fipe).

“O papel do corretor e do consultor é fundamental, não só quanto aos bens materiais, mas também quanto aos bens pessoais e patrimoniais de todos os nossos clientes. Esse é o nosso papel”, relata.

Thiago Silva, 36, também já foi o socorro necessário de clientes aflitos que tiveram uma situação de sinistro – até mesmo durante a folga. “Uma vez, eu estava de férias, na praia, e meu telefone tocou: ‘Thiago, minha esposa acabou de bater o carro no portão do vizinho’. Eu resolvi tudo para ela, da praia, via aplicativo, com 5 minutos. Eu acionei o reboque e resolvi tudo”, lembra.

Thiago Silva atua no ramo há anos e aposta no pós-venda para fidelizar o cliente

Ele reforça que esse auxílio do corretor na hora do sinistro é fundamental para passar credibilidade. “O pós-venda é fundamental para o crescimento da empresa. Porque é na hora de um desespero de um cliente que vai ser o ‘x’ da questão para aquele cliente me indicar para um amigo e falar: olha esse cara que é bem confiável, ele me ajudou no momento que eu mais precisei”, diz;

Edire Rezende de Oliveira, 66 anos, é corretora há 48 anos e tem diversas histórias de clientes que, quando precisaram acionar o seguro, foram direto até ela para pedir assessoria. Aliás, em todos esses anos, muitos se tornaram clientes fiéis – o mais antigo está com ela há 45 anos. “Uma boa parte dos clientes, quando quer fazer qualquer tipo de seguro, me liga para saber como funciona e com qual empresa ele deve fazer”, revela.

“Quando comecei, uma boa parte dos clientes eram solteiros. Hoje 99% são casados, alguns com filhos e netos. Hoje eu tenho o privilégio de atender os familiares de uma boa parte dos clientes, que indicam amigos. Volta e meia eu recebo ligações de filhos de clientes solicitando atendimento por indicação do pai ou do avô. Amo o que faço”, relata. 

Em um dos casos de sinistro, o cliente morreu e foi ela quem resolveu todos os trâmites para que a esposa do falecido recebesse o que tinha direito na seguradora. Ela conta que, muito abalada, a mulher não tinha forças para se envolver com as burocracias necessárias. Em outro caso, ela conheceu a viúva no velório e, mais uma vez, resolveu todas as questões burocráticas, e a viúva acabou virando sua cliente fiel também. “O único seguro que ela recebeu foi o que ele fez comigo. Ele tinha outro, mas só cobria acidente, e o caso dele foi morte por doença”, lembra.

“No momento do sinistro, o corretor pode evitar erros de comunicação que podem prejudicar ou retardar a comunicação, contribuindo para que a regulação de sinistro seja a mais eficaz possível”, pontua a diretora técnica da Susep, Jessica Bastos.

Crescimento na profissão

Tanto Campos quanto Silva e Edire fazem parte de uma leva de corretores que iniciaram no ramo de seguros há muitos anos e viram na profissão de corretor um ofício muito rentável e que permitia crescimento. Os três começaram dentro de empresas do segmento e depois abriram o próprio negócio. No caso de Campos e de Silva, eles atuavam como office boys, cresceram dentro das respectivas empresas e, depois, abriram a própria corretora. Já Edire começou direto como corretora e, tempos depois, abriu o próprio CNPJ.

Edire Rezende iniciou a jornada em 1976, passou anos trabalhando como corretora de seguros e consultora, mas vinculada a outra corretora e, em 2001, abriu sua própria corretora, com CNPJ, focada em vida, previdência e capitalização. Há muitos anos, seus principais clientes são médicos. 

Renato Campos iniciou a carreira em 1996, aos 16 anos. Tempos depois, foi promovido a auxiliar administrativo, assistente de vendas, assistente comercial, multiplicador de talentos ( fazendo treinamento de corretores), até que passou a ser gerente. Em 2013, ele fez a prova da Susep para ter o registro como corretor e abriu a própria corretora de seguros.

Já Thiago Silva entrou no ramo de seguros aos 18 anos e também foi crescendo na profissão até se tornar gerente de uma corretora. Há dois anos, ele abriu a própria corretora de seguros ao lado de uma sócia, que é quem assina as apólices, e hoje estuda para fazer a prova da Susep para ter o registro de corretor de todos os ramos (um registro que permite comercializar qualquer tipo de seguro, previdência, plano de saúde ou outros tipos de serviços).

Como se formar corretor?

Quem quer entrar no mercado precisa ter a carteira de corretor, ou seja, um registro profissional. O documento é expedido após aprovação no exame de habilitação obrigatório realizado pela Susep. Esse exame inclui a aplicação de provas que vão contar com questões sobre capitalização, vida, previdência etc.

Ao todo, são quatro dias de prova, e o candidato pode escolher os módulos nos quais deseja se inscrever. Candidatos aprovados em Capitalização (1º dia) e Vida e Previdencia (2º dia) já podem comercializar seguros de vida, títulos de capitalização e planos de previdência privada. Essa é a popularmente chamada “susepinha”. Ao ser aprovado nos demais módulos, o candidato garante a “susepona”, registro que permite a comercialização de todos os ramos de seguros.

As provas são aplicadas pela Escola de Negócios e Seguros (ENS) e contam com questões de múltipla escolha. É necessário ter um aproveitamento de 70% de acertos e não zerar nenhum módulo. E para se preparar para essas provas, diversos institutos especializados oferecem cursos de capacitação. 

Jessica Bastos reforça a importância do registro profissional e lembra que a Lei nº 4594 de 1964 regulamenta a profissão do corretor de seguros e determina que as seguradoras somente podem receber propostas por intermédio de corretor devidamente habilitado. “É importante que todas as partes envolvidas na operação de seguros atuem ativamente para combater a informalidade na profissão dos corretores de seguros”, reforça.

Além disso, manter-se atualizado e fazer cursos na área pode contribuir, e muito, para o sucesso na profissão. Ela pontua que os avanços tecnológicos trazem novos modelos de negócios e novas demandas por seguros. “Os corretores serão de extrema importância para auxiliar, sempre que necessário, as escolhas dos consumidores nesses novos caminhos”, diz.

Qual a diferença de ser corretor pessoa física e pessoa jurídica

Basicamente, o corretor pessoa jurídica tem uma empresa, uma corretora, e pode ter diversos funcionários e outros corretores trabalhando para ele. Ele presta serviço para as seguradoras e paga impostos de uma forma diferente dos corretores pessoa física. Já o corretor pessoa física presta serviço para a seguradora, mas geralmente está vinculado a uma corretora. Quando ele chega em um patamar de ter uma cartela grande de clientes, segundo corretores consultados, acaba sendo mais benéfico abrir um CNPJ.

Fonte:O Tempo