Segundo a Confederação Nacional das Seguradoras (CNseg), o setor de seguros no Brasil vai manter o crescimento de dois dígitos em 2024. Caso confirme-se a previsão da entidade, o mercado deve avançar 11,7%  neste ano, alcançando o quarto ano seguido de expansão no segmento acima de 10%. As informações são do site Valor Econômico. 

Desde 2021, a arrecadação da indústria de seguros tem subido no ritmo de dois dígitos anuais. O movimento recupera a desaceleração vista no primeiro ano da pandemia, quando o setor fechou com avanço de 1,3% afetado pelas medidas de combate à covid-19. Em 2023, o segmento apresentou expansão de receitas de 10,4%, nas estimativas da CNseg, com um faturamento de cerca de R$ 410 bilhões, sem considerar a saúde suplementar. No total, se for incluído esse segmento, a confederação calcula que as receitas tenham alcançado R$ 663 bilhões. O resultado do ano passado ainda não está fechado, pois faltam os números de dezembro, que serão divulgados pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) em fevereiro.

Os dados consolidados de janeiro a novembro do ano passado mostram um avanço acumulado de 8,9%, o que representa arrecadação de R$ 351 bilhões, desconsiderando a saúde suplementar. No período, o setor devolveu aos usuários R$ 207,3 bilhões na forma de indenizações, benefícios, resgates e sorteios.

Dyogo Oliveira, Presidente da CNseg, destaca que a expectativa para o mercado em 2024 é de otimismo, tendo em vista a queda de juros, inflação controlada e mercado de trabalho aquecido aumentam a demanda por produtos de seguro tanto entre as pessoas físicas quanto empresas. “Apesar das turbulências no início, 2023 foi um ano positivo para o setor e este ano será ainda melhor. Por todo lado vejo ‘drivers’ favoráveis de crescimento. Vemos, no Brasil, massa salarial crescendo, juros em queda e um conjunto de fatores positivos para a economia brasileira neste ano. A inflação está desacelerando no mundo, a economia americana está bem e, em algum momento, os EUA vão começar a cortar juros. Como o mercado se antecipa, a tendência é haver fluxo de investimentos maior aos emergentes, o que ajuda a segurar a volatilidade do câmbio e traz alívio de pressões inflacionárias”, disse. 

O CEO da Generali no Brasil, Andrea Crisanaz, faz diagnóstico semelhante. “O ano de 2023 foi um bom período para a indústria de seguros no país”, avalia. “Houve uma recuperação no ano passado e o mercado brasileiro foi muito resiliente, comparado, por exemplo, com a Europa”, afirma. Na visão do executivo, o mercado brasileiro conseguiu se reposicionar bem após a pandemia.

“O ano de 2023 foi uma espécie de colheita após um período de rebalanceamento do mercado [em 2022]”, afirma o CEO da HDI no Brasil, Eduardo Dal Ri. “O setor tinha de reposicionar suas margens [após o impacto da inflação e da pandemia]. Agora, em 2024, o mercado vai consolidar essa estratégia e voltar um pouco mais a sua vocação original, que é esse olhar ainda mais atento às necessidades dos clientes.”

CEO da Porto Seguro, vertical de seguros do grupo Porto, Rivaldo Leite pontuou que o desempenho do ano passado supera as expectativas, que já eram positivas. Para 2024, o executivo enxerga uma sequência positiva, tendo em vista que o país está em um momento oportuno. 

De acordo com a CNseg, entre “janeiro e novembro de 2023, os maiores aumentos de arrecadação ficaram por conta de dois ramos da modalidade patrimonial: o seguro condomínio, que avançou 33,3%, totalizando R$ 611 milhões, e o pecuário, com alta de 27,2% e faturamento de R$ 1,4 bilhão. Outro ramo de destaque foi o de grandes riscos, voltado à proteção de patrimônio acima de R$ 15 milhões, que avançou 25,8% para uma receita de R$ 7,1 bilhões. Os seguros garantia, por sua vez, tiveram alta de 20,3% e arrecadaram R$ 5,2 bilhões em 11 meses. Duas categorias tradicionais, auto e vida, registraram expansões de dois dígitos. As apólices para veículos faturaram, segundo levantamento da CNseg, R$ 50,6 bilhões, com crescimento de 10,7%. Já as de vida atingiram R$ 27,5 bilhões, o que representa expansão de 12,4%.

No que diz respeito a termos de indenizações e benefícios pagos em 2023, o seguro de crédito aparece em primeiro, com a maior taxa de avanço, impactado por eventos como as recuperações judiciais de grandes grupos empresariais, como Americanas, Light e Grupo Petrópolis. A modalidade apresentou significativa alta de 157,7% e R$ 1,7 bilhão de desembolsados por parte das seguradoras. Na sequência, aparecem o seguro pecuário, que registrou elevação de 56,2% e R$ 792,5 milhões em indenizações, e os riscos de engenharia com alta de 44,8% e pagamento de R$ 589,4 milhões. 

Executivos do setor dizem que parte do otimismo em relação ao atual período vem da percepção de que eventos pontuais negativos não venham a ocorrer neste ano. O CEO da Generali aponta como exemplo a crise gerada pela descoberta da fraude contábil das Americanas. “Temos muitas parcerias [de distribuição de seguros] com varejistas, que sofreram com o cenário macroeconômico mais difícil e a crise das Americanas”, diz.

Oliveira, da CNseg, cita ainda o setor rural, que teve no início de 2022, a maior seca em décadas: “Vemos o setor de seguros com crescimento bom de receitas e pagamento de indenizações bem comportado. Houve, no passado recente, eventos com grande influência na sinistralidade, como o rural que, em 2022, gerou mais de R$ 10 bilhões em indenizações.”

Dal Ri, da HDI, acrescenta que os efeitos do cenário macroeconômico ainda desafiador ao longo de 2023 vão ter menos efeito neste ano. “Por exemplo, tivemos menos vendas de veículos financiados no ano passado. No mercado, entre automóveis e utilitários novos e usados, somamos 14 milhões de veículos comercializados em 2023. Mas, quando a melhora do crédito para a população, com melhora de ‘scores’ [notas de crédito], se consolidar, as vendas podem subir para algo entre 15 milhões e 16 milhões de veículos. A redução de juros impacta o Brasil de forma muito virtuosa.”

O CEO da Porto Seguro, no entanto, chama a atenção para variáveis que trazem preocupações. As mudanças climáticas, por exemplo, se mostram um dos principais fatores de incertezas. “Olhando o lado climático tem uma luz amarela”, diz. “No ano passado, o mercado sofreu com as enchentes em fevereiro. Estamos acompanhando de perto essa situação do clima com estudos e contato com órgãos especializados. É uma preocupação que vem aumentando.”

Na visão de Crisanaz, da Generali, “o tema de fenômenos climáticos preocupa”, porque têm sido vistas diversas situações fora do padrão, caso das recentes chuvas no Rio e em São Paulo”. De acordo com o executivo, “apesar do aumento da frequência de eventos, o cenário alimenta a ideia de que é necessário ter uma cobertura”.

O presidente da CNseg reforça a percepção das empresas. “O tema da mudança climática tem sido objeto permanente de preocupação da indústria de seguros no mundo inteiro”. Para o dirigente, uma questão importante se refere às mudanças de padrões históricos. “Os modelos que o setor usa [para avaliar os riscos] são baseados em dados históricos e a mudança climática quebra o comportamento histórico. Em certa medida, a capacidade de prever riscos climáticos diminuiu nos últimos anos.”

Em outubro de 2023, a CNseg apresentou a proposta de criação de um seguro para catástrofes no Brasil. Um substitutivo ao projeto de lei 1.410/22 da deputada federal Tábata Amaral (PSB-SP), que já está em tramitação na Câmara dos Deputados. A confederação sugeriu a implementação de uma espécie de seguro social, financiado por uma taxa de R$ 2 cobrada nas contas de energia. O projeto prevê pagamento quase imediato de indenização às vítimas de catástrofes, como inundações e deslizamentos. Um valor de até R$ 15 mil seria creditado aos beneficiários por meio do Pix um dia após o evento.

Outra iniciativa foi firmada pela CNseg e o ICLEI, associação mundial de governos locais e subnacionais voltada ao desenvolvimento sustentável, no início do ano. O compromisso se refere ao projeto “Mecanismo de Seguro para Infraestruturas Urbanas”. A parceria visa criar um programa de seguros de suporte a municípios em caso de desastres climáticos. O projeto contará com subsídio do Banco Alemão de Desenvolvimento (KfW) e será implementado inicialmente em Belo Horizonte (MG), Recife (PE) e Salvador (BA). “Esses seguros vão garantir a infraestrutura de municípios, além de prédios públicos, estradas, pontes e outras estruturas”, afirma Oliveira.

Fonte: CQCS